As Origens
A criação da Corte representou o auge de um longo período de desenvolvimento de métodos para a solução pacífica de controvérsias internacionais, cujas origens podem ser identificadas na idade Moderna.
O artigo 33 da Carta das Nações Unidas lista os seguintes métodos para a solução pacífica de controvérsias entre Estados: negociação, inquérito, mediação, bons ofícios, conciliação, arbitragem e soluções judiciárias.
A mediação e a arbitragem precederam as soluções judiciárias historicamente. A primeira era utilizada na Índia antiga e no mundo islâmico, enquanto há inúmeros exemplos do uso desta última na Grécia antiga, na China, entre tribos árabes, e no direito marítimo costumeiro na Europa medieval.
A necessidade de novas formas para solução de controvérsias também foi levantada na Conferência de Paz da Haia de 1899, que resultou na adoção da Convenção sobre a Solução Pacífica de Disputas Internacionais, que lidava não só com arbitragem, mas também com outros métodos de solução pacífica, como os bons ofícios e a mediação. Seu grande trunfo, no entanto, foi a criação da Corte Permanente de Arbitragem, uma instituição que consiste em um painel de juristas conhecidos por sua excelência, que são indicados por diversos países. No caso de dois ou mais países em meio a uma disputa decidirem pela solução arbitral, o tribunal deverá ser formado por membros dessa lista, de acordo com o costume internacional. Esse órgão, embora não constitua uma Corte no sentido mais preciso da palavra, representou a institucionalização das práticas de arbitragem oferecendo um método para facilitar a formação de tribunais arbitrais quando necessário. Essa Corte começou a funcionar em 1902, existe até hoje e possui um escritório permanente na Haia, com funções administrativas e de secretariado.
Alguns anos depois, em 1907, em uma segunda Conferência da Haia, para a qual países da América Central e do Sul foram convidados, a Convenção foi revisada e novas regras concernentes aos procedimentos arbitrais foram incluídas. A Conferência se limitou a recomendar que os Estados adotassem um esboço de convenção para a criação de uma corte arbitral de justiça assim que um acordo fosse alcançado. Embora a corte discutida na Conferência nunca tenha saído do papel, o esboço da convenção já trazia em si as idéias fundamentais que serviram de inspiração para a criação, anos mais tarde, do Estatuto da Corte Permanente de Justiça Internacional (CPJI).
A Corte Permanente de Justiça Internacional
O artigo 14 do Pacto da Liga das Nações (1919) deu ao Conselho da Liga a responsabilidade de formular um plano para o estabelecimento de uma corte permanente de justiça internacional, que teria a competência não só de apreciar qualquer disputa internacional submetida a ela por seus Estados partes, como também de oferecer pareceres consultivos a respeito de qualquer disputa apresentada a ela pelo Conselho ou Assembléia da Liga.
A Corte Permanente de Justiça Internacional realizou sua primeira sessão em 15 de fevereiro de 1922, e representou um grande avanço na história do Direito Internacional Público por inserir novos elementos à solução pacífica de controvérsias, tais como:
• Diferentemente dos tribunais arbitrais, a CPJI era formada por um corpo permanente de juristas, regulada por um estatuto e um regulamento próprios fixados de antemão e obrigatórios às partes que recorressem a Corte.
• A Corte dispunha de um secretariado permanente, o qual, entre outras coisas, servia como um canal de comunicação entre governos e organizações internacionais.
• Seus procedimentos eram amplamente conhecidos e diversas medidas eram tomadas para que as alegações, os procedimentos orais, e toda a documentação apresentada fosse publicada dentro do devido prazo.
• O fato de ser permanente permitiu que suas decisões formassem gradualmente uma base jurídica que auxiliou o desenvolvimento do direito internacional.
• Como a Corte era acessível a todos os países que aceitassem sua jurisdição, ela foi o órgão judiciário mais representativo da comunidade internacional até então.
Embora a Corte Permanente de Justiça Internacional tenha sido concebida e criada pela Liga das Nações, ela nunca foi parte formal da Liga. Havia uma grande ligação entre os dois órgãos, uma vez que os membros da Corte eram eleitos pelo Conselho e pela Assembléia da Liga; no entanto, os membros da Liga não eram necessariamente membros da Corte, e o seu Estatuto não fez parte do Pacto da Liga.
A Corte Permanente de Justiça de Internacional funcionou de 1922 a 1940 e nesse período lidou com 29 casos contenciosos e ofereceu 27 pareceres consultivos.
A criação da Corte Internacional de Justiça
A eclosão da Guerra em setembro de 1939 teve sérias conseqüências para a CPJI, que já há alguns anos passava por um período de atividade reduzida. Após sua última sessão pública em 04 de dezembro de 1939, a CPJI não lidou com mais nenhuma questão judicial e não realizou mais eleições para juízes. Mas mesmo sob a tensão da Guerra, era inevitável manter algum pensamento a respeito do futuro da Corte, ou da criação de uma nova.
No início de 1943 foi formada uma Comissão Inter-Aliada (que incluía Estados Unidos e Reino Unido) que após 19 reuniões, nas quais participaram juristas de 11 países, publicou um relatório que recomendava:
• Que o Estatuto de qualquer nova corte internacional devia se basear naquele da Corte Permanente de Justiça Internacional;
• Que a jurisdição consultiva deveria ser assegurada nessa nova corte;
• Que a aceitação da jurisdição da nova corte não deveria ser compulsória;
• Que a corte não deveria ter jurisdição sobre matérias essencialmente políticas.
Após a publicação, em 1943, de uma declaração formulada pela China, URSS, Estados Unidos e Reino Unido que destacava a necessidade de criação de um órgão supranacional responsável pela paz e segurança internacional, originou-se uma proposta para o estabelecimento de uma organização internacional, que incluísse uma corte internacional de justiça. Formou-se então uma Comissão para se discutir as bases para a criação dessa corte e para apresentar um rascunho de Estatuto na Conferência de São Francisco, que estava marcada para 1945 e tinha como objetivo estabelecer a Carta das Nações Unidas. O rascunho de Estatuto preparado pela Comissão se baseava naquele da Corte Permanente de Justiça Internacional embora deixasse diversas questões para serem discutidas na Conferência, como se se deveria ou não criar uma nova corte.
Na Conferência decidiu-se que uma corte completamente nova deveria ser criada e que esta não deveria ter jurisdição compulsória. Ela seria um órgão principal das Nações Unidas, em pé de igualdade com a Assembléia Geral e o Conselho de Segurança. As principais razões para a criação de uma nova corte foram:
• Como a corte estava destinada para ser o principal órgão judiciário das Nações Unidas, parecia inapropriado que esse papel fosse designado à Corte Permanente de Justiça Internacional, que havia sempre estado ligada à Liga das Nações até a sua dissolução;
• A criação de uma nova corte era mais consistente com a previsão da Carta de que todos os Estados Membros das Nações Unidas seriam ipso facto partes no Estatuto;
• Diversos Estados que eram partes no Estatuto da CPJI não estavam representados na Conferência de São Francisco assim como muitos Estados representados na Conferência não eram partes no Estatuto;
• Havia um sentimento entre certos países de que a CPJI fazia parte de uma ordem mundial antiga, na qual os Estados europeus dominavam os assuntos políticos e legais da comunidade internacional, e que a criação de uma nova corte tornaria mais fácil para os Estados fora da Europa representar um papel mais influente. Isto de fato aconteceu uma vez que o número de membros da ONU cresceu de 51 em 1945 para 192 em 2006.
A Conferência, no entanto, mostrou preocupação em manter certa continuidade com o passado. A Carta das Nações Unidas estabelece claramente que o Estatuto da Corte Internacional de Justiça foi baseado no da CPJI; e a criação de uma nova corte implicava necessariamente na dissolução de sua predecessora. A CPJI se reuniu pela última vez em outubro de 1945 quando foi decidido que todas as providências cabíveis seriam tomadas para assegurar as transferências de seus arquivos para a nova Corte Internacional de Justiça, que, como a sua predecessora, seria instalada no Palácio da Paz, na Haia. Os juízes da CPJI renunciaram em 31 de janeiro de 1946 e em 06 de fevereiro de 1946 – quando da primeira sessão da Assembléia Geral das Nações Unidas e de seu Conselho de Segurança – foi realizada a eleição dos primeiros membros da Corte Internacional de Justiça. Em abril de 1946, a CPJI foi formalmente dissolvida, e Corte Internacional de Justiça, reunida pela primeira vez, elegeu como seu Presidente o Juiz José Gustavo Guerrero (EL Salvador), o último Presidente da CPJI. A Corte designou os membros de seu Secretariado (amplamente formado por ex-membros da CPJI) e realizou sua primeira sessão pública no dia 18 daquele mês. O primeiro caso foi submetido em Maio de 1947. Ele dizia respeito a incidentes no Canal de Corfu e foi apresentado pelo Reino Unido contra a Albânia.
Adaptado do site da Corte Internacional de Justiça: www.icj-cij.org