A outorga do Prêmio ocorreu no dia 18 de dezembro, em sessão solene na Sala do Conselho Universitário.
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Categoria Individual
ZILDA ARNS NEUMANN
Em 1983, na cidade Florestópolis, no Paraná, a CNBB iniciou a Pastoral da Criança dando a coordenação à médica pediatra e sanitarista Dra. Zilda Arns Neumann, já com longa experiência em saúde materno-infantil. As atividades da Dra. Zilda Arns estendem-se de Norte a Sul do país. A mortalidade infantil foi reduzida a menos da metade nas periferias das grandes cidades e nos bolsões de miséria onde ela vem atuando. Sua ação abrange hoje 27 estados e 2891 municípios, atendendo a cerca de 20 mil comunidades. Sob sua coordenação, a Pastoral da Criança tornou-se a maior ONG do mundo em relação à saúde da gestante e da criança até seis anos. Já foram atendidas até o ano de 2000, cerca de 1.263.963 crianças, 86.186 famílias e 61.753 gestantes através de aproximadamente 20.000 líderes comunitários. A Dra. Zilda Arns promoveu projetos alternativos simples de geração de renda (que incluem desde granjas agrícolas, fabrico de pães e doces, até confecções de roupas). Seus projetos resultam em políticas públicas. Os grupos comunitários participam da formulação e implementação dessas políticas, atuando em conselhos municipais e estaduais, firmando parcerias com órgãos governamentais e não-governamentais, bem como buscando apoio nacional e internacional. O conjunto de projetos constitui modelo de políticas públicas, um verdadeiro convite à sua multiplicação em todo território nacional. Não sem motivos, seu êxito já ultrapassou nossas fronteiras, contribuindo para a formação de líderes comunitários em Angola e Guiné-Bissau. Os compromissos da Dra. Zilda Arns com a promoção dos direitos humanos e com princípio éticos universais são patentes. O exame de seus projetos deixa entrever o efetivo acesso de populações carentes a direitos universais, como sejam o direito à saúde, o direito ao trabalho, o direito à educação, o apoio à família, enfim a promoção do mais importante dos direitos, o direito à vida. Acresce notar a todas essa qualidades, flagrante preocupação com o registro da memória dessa experiência.
Categoria Institucional
THEMIS – ASSESSORIA JURÍDICA E ESTUDOS DE GÊNERO
Organização da Sociedade civil, sediada em Porto Alegre (RS), a THEMIS iniciou suas atividades em 1993. Desde seu nascimento, sua plataforma de ação mantém estreitos compromissos com o reconhecimento dos direitos das mulheres, nos termos dos debates verificados por ocasião da Conferência Mundial dos Direitos Humanos (Viena, 1993). Sob esta perspectiva, sua atuação tem-se concentrado na ampliação do acesso das mulheres à justiça mediante desenvolvimento de três programas de trabalho: o programa de formação de promotoras legais populares (PLPs); o programa de advocacia feminista e o programa de estudos e publicações sobre gênero e direito. O programa de formação de promotoras legais populares (PLPs) é, sem margem de dúvida, a marca de distinção da THEMIS. Ele consiste na capacitação de lideranças comunitárias feministas para operarem no mundo do direito e dos direitos. Compreende a difusão de conhecimentos básicos sobre o funcionamento das agências e instâncias de distribuição de justiça e de aplicação das leis; e a disseminação de conhecimentos sobre violência contra as mulheres, direitos reprodutivos, discriminação racial e discriminação no mundo do trabalho.O programa de advocacia feminista foi criado devido à inadequação dos serviços públicos tradicionais (postos policiais e mesmo delegacias especializadas) para atendimento de casos de graves violações de direitos das mulheres, em particular contra a violência e à prestação de assistência social e de saúde. O programa de estudos e publicações sobre gênero e direito tem por objetivo a ampla difusão de conhecimentos, sob a forma de conferências, seminários, publicações e material audio-visual. A maior contribuição da THEMIS tem sido restituir às mulheres o direito a ter seus direitos reconhecidos.
PRONUNCIAMENTO DO REITOR JACQUES MARCOVITCH NA CERIMÔNIA DE ENTREGA DO PRÊMIO USP DE DIREITOS HUMANOS - 18/12/2000.
Minhas senhoras e meus senhores
Quero inicialmente agradecer a todos os colegas envolvidos com esta primeira edição do Prêmio USP de Direitos Humanos. Ao Pró-Reitor de Cultura e Extensão. Universitária, professor Adilson Avansi de Abreu, à Comissão de Direitos Humanos, presidida pela professora Maria Luiza Marcilio, e à Comissão Julgadora do Prêmio, formada pelos professores Ecléa Bosi, Sérgio Adorno e Terezinha Fram. Apresento, em nome da comunidade universitária, merecidas e efusivas congratulações aos seus ganhadores: na categoria individual, à doutora Zilda Aros Neumann, e na categoria institucional à Themis - Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero.
As razões da justa premiação já foram descritas pela professora Maria Luiza. Cabe-me reiterar que este Prêmio foi criado com a finalidade de homenagear pessoas de qualquer posição, ou entidades, organismos não governamentais, instituições e governos que tenham desenvolvido trabalhos, políticas públicas bem sucedidas ou iniciativas de áreas da cultura, educação, saúde, segurança e desenvolvimento social.
Esta é uma homenagem em tudo coerente com ideário acadêmico. Na Universidade, antes de qualquer norma, estatuto ou regimento, há uma escala de valores inscrita na consciência de todos e de cada um. Valores resumidos' admiravelmente, por exemplo, na Declaração Universal dos Direitos Humanos – a maior carta de cidadania produzida neste século.
Ao contrário de outros documentos, importantes na época de sua elaboração e logo devorados pela traça do tempo, esta Declaração nasceu para eternizar-se na memória dos homens. Se pudéssemos resumir os seus trinta artigos numa só palavra, esta palavra seria liberdade. E toda a trajetória da civilização nos ensina que a liberdade é precondição indispensável para a felicidade e o bem estar dos indivíduos.
Voltada para as prerrogativas inalienáveis dos indivíduos, a Declaração implicitamente exige que cada pessoa mantenha em seu íntimo a convicção de que os seus semelhantes são merecedores não apenas de compreensão, tolerância e respeito, mas de comida, escola e outros fatores essenciais para a fruição da existência. A segurança social está comprometida na maioria das nações. Os direitos fundamentais não devem restringir-se ao plano subjetivo. Há iniqüidades concretas a serem combatidas: fome, ignorância, discriminação.
Mas cabe sublinhar que leis, declarações ou cartas de princípios têm amargado reveses em freqüentes e grandes proporções. Os dez princípios adotados pela Assembléia das Nações Unidas e constantes da Declaração dos Direitos da Criança, em vigor há 41 anos, infelizmente parecem falar de um planeta imaginário – pois em todas as partes do nosso planeta real são desrespeitados a cada instante que passa.
Quer isto dizer que os documentos dec1aratórios são inúteis? Absolutamente, não. São fundamentais para a conscientização dos indivíduos e para induzir autoridades a implementar políticas públicas. Mas, para que tais políticas efetivamente funcionem, é necessário que a sociedade se transforme, ampliando a convicção humanista de cada grupo e de cada indivíduo. E entre os mecanismos que podem contribuir para essa transformação, a universidade é certamente um dos mais fortes e mais aparelhados.
A universidade não deve restringir-se aos estudos teóricos. É também sua missão desenvolver ações internas que sirvam de modelo para iniciativas comunitárias ou governamentais de maior alcance. Não lhe basta celebrar condignamente os documentos que guiaram a humanidade no caminho da justiça. É necessário que tenhamos os olhos postos no mundo real e ponhamos as nossas competências a serviço de transformações positivas. Insere-se neste quadro a formação de alunos que, além do conhecimento necessário ao exercício de futuras profissões, aprofundem sua noção de valores e princípios voltados para a cidadania. É preciso que cada qual se torne um agente de mudança. Esta é a responsabilidade maior da universidade pública. Como a Universidade de São Paulo é também sustentada pelo contribuinte, espera-se que todo estudante nela formado tenha consciência de sua dívida para com a sociedade que o manteve e lhe deu a oportunidade de acesso ao ensino superior.
Foi também com esta visão solidária da missão universitária, que instituímos o Prêmio USP de Direitos Humanos. Lembremos, no lançamento de sua primeira edição, que nem toda utopia morreu no século vinte. Confiemos que no milênio vindouro, dentro de exatos 14 dias, não celebraremos apenas a vigência formal dos códigos generosos, mas a plena materialização dos seus valores e princípios.
Muito obrigado.
A Universidade de São Paulo está, nesta noite, em festa. Juntos estamos festejando e reafirmando a fé nos Direitos Humanos fundamentais, na dignidade e no valor de pessoa humana, e na distinção daqueles que neste país decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida para nossas populações. Estamos aqui juntos celebrando a compreensão comum dos direitos e das liberdades da pessoa humana. Estamos aqui juntos demonstrando e repetindo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos que o desprezo e o desrespeito por esses mesmos Direitos Humanos resultam em atos bárbaros que ultrajam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os Homens gozem de liberdade de palavra, de crença, de liberdade de viverem a salvo do terror e da necessidade, e onde vivam em uma sociedade mais igualitária foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum. Estamos aqui hoje para festejar o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis como fundamento da liberdade, da justiça, da paz e da felicidade dos homens.
A pessoa humana tem sua dignidade absoluta, nos ensina Jacques Maritain, o filósofo que ajudou a elaborar e redigir a Declaração Universal dos Direitos Humanos. O fim da sociedade não é o bem individual ou a simples coleção dos bens individuais de cada pessoa que a constitui. Isso conduziria à "anarquia dos átomos", diz ainda Maritain. O fim da sociedade é o bem comum dela própria, o bem do corpo social. Sob pena de desnaturar o bem comum, o reconhecimento dos direitos fundamentais das pessoas é condição primordial. Ele comporta em si e como valor principal, a ascensão, o mais alto possível da pessoa, à sua vida, à sua liberdade, às suas comunicações de bondade, que a precedem.
Por isso mesmo, um primeiro caráter essencial do bem comum implica numa redistribuição, ajudando as pessoas em seu desenvolvimento pleno. Isso significa que seu caráter é tornar o Homem mais verdadeiramente humano e a manifestar sua grandeza original fazendo-o participar de tudo o que pode enriquecer sua natureza e sua história; requer ao mesmo tempo que o Homem desenvolva as virtualidades contidas nele próprio, suas forças criativas e a vida da razão, e trabalho para tornar as forças do mundo físico em instrumentos de sua liberdade.
Por acreditar e por estar envolvido no desenvolvimento desses valores, o primeiro ato do Professor Doutor Jacques Marcovitch, logo depois que foi empossado como Reitor desta Universidade, foi a criação da Comissão de Direitos Humanos da USP, em 10 de Dezembro de 1997 (o dia em que se celebra o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos). Com forte emoção, e grandemente honrada, recebi do Magnífico Reitor a alta missão de presidi-Ia. Não sem razão, determinou o Reitor que a sede da nova Comissão seria o Centro Universitário Maria Antônia, símbolo da resistência ao regime de opressão, de tortura, de violação das liberdades.
Uma das primeiras missões da Comissão foi celebrar, na Universidade, e durante todo ano de 1998, o Jubileu da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o maior documento escrito pelo Homem do Século XX. No dia 10 de dezembro desse ano, quando se encerravam solenemente as variadas atividades organizadas pela Comissão, com o Congresso Nacional de Direitos Humanos, reunido na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, o Magnífico Reitor anunciou a criação do PRÊMIO USP DE DIREITOS HUMANOS. Pela primeira vez na história da Universidade brasileira instituía-se um prêmio cujo objetivo maior era o de identificar e de distinguir pessoas e instituições que, por suas ações exemplares, estivessem contribuindo significativamente para a defesa, a promoção e a difusão dos Direitos Humanos em nosso país.
Estabelecidos o Regulamento e as bases do Prêmio, foram abertas as inscrições de candidaturas às duas modalidades oferecidas: individual e institucional. Foram 67 as inscrições que se apresentaram, vindas de todas as regiões do país e cobrindo vários setores de atuação.
Encerradas as inscrições, foi constituída uma Comissão Julgadora, nomeada pelo Reitor, e composta por três personalidades da mais alta relevância no mundo acadêmico e na sociedade e envolvidas na promoção dos Direitos Humanos neste país: A Drª.Ecléia Bosi, do Instituto de Psicologia; o Dr. Sérgio França Adorno de Abreu, do Núcleo de Estudos da Violência; e a educadora Drª.Terezinha Fran, representando a sociedade.
Essa Comissão estabeleceu critérios de julgamento para a atribuição do Prêmio; estes critérios serão doravante incorporados e adotados pela USP, para os próximos Prêmios anuais que se sucederão. Os critérios elaborados incluem: duração e continuidade do trabalho; alcance no espaço social, impacto sobre a realidade e possibilidade de multiplicação de sua ação; amplitude da população atingida; qualidade da ação realizada; abordagem que revele um conceito amplo e abrangente dos Direitos Humanos; compromisso com a formulação e implementação de políticas públicas que possibilitem o avanço dos Direitos Humanos; compromisso com os princípios éticos universais; e por último, registro da memória da experiência.
Com base nesses critérios, a comissão julgadora e o Magnífico Reitor da USP atribuíram o Primeiro Prêmio USP de Direitos Humanos, ano 2000, na categoria individual à:
Drª. Zilda Arns Neuman
E na categoria institucional à:
THEMIS: Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero
A Drª. Zilda Arns é médica pediatra e sanitarista. Fundou em 1983 e coordena a Pastoral da Criança, entidade ligada à CNBB.
Conhecida em todo o mundo como uma das instituições mais atuantes na proteção à infância e à maternidade, a Pastoral da Criança já recebeu diversos prêmios nacionais e internacionais. A coordenadora da Pastoral da Criança é ainda a provável candidata do governo brasileiro ao Prêmio Nobel da Paz de 2001.
Este reconhecimento deve-se ao atendimento coordenado pela Drª. Zilda Arns a mais de um milhão e meio de crianças menores de seis anos e a 76 mil gestantes em todo o Brasil. Nos mais de três mil municípios onde a Pastoral atua, a mortalidade infantil está entre 12 e 18 óbitos de nascidos vivos e menores de um ano para cada mil habitantes, menos da metade da média brasileira, que é de 36. A desnutrição também apresenta níveis menores nos locais atendidos pela entidade: é de 8% das crianças acompanhadas, enquanto no restante do país a média está entre 16%.
Para alcançar tais resultados a Pastoral realiza ações simples e de baixo custo, como o incentivo ao aleitamento materno, o ensino do soro caseiro e orientações sobre noções básicas de higiene e alimentação. Drª. Zilda tem ainda se dedicado a projetos para melhorar a qualidade de vida das populações carentes, com programas de geração de emprego e de renda e cursos de alfabetização para jovens e adultos. Para todos esses trabalhos a Pastoral gasta o equivalente a menos de R$1,OO ao mês com cada criança atendida.
Na categoria Institucional o Prêmio USP de Direitos Humanos vai para a THEMIS - assessoria jurídica e estudos de gênero, fundada em 1993 e sediada no Rio Grande do Sul. A Themis desenvolve importante trabalho na ampliação das condições de acesso das mulheres à justiça através da criação de novos mecanismos de defesa e de promoção de seus direitos. A ação da THEMIS concentra-se em três frentes: Formação de promotores legais populares, com a finalidade de capacitação legal de mulheres da classe popular; Advocacia feminista que objetiva a prestação de assistência jurídica; Estudos, Pesquisas e Publicações, com a realização de cursos, seminários fóruns e publicações sobre as relações de gênero e Direitos da Mulher.
A Themis já capacitou 180 mulheres, líderes comunitárias e multiplicadoras da promoção dos Direitos Humanos e da cidadania na grande Porto Alegre. Entre estas, 70 atuam voluntariamente como promotoras legais populares em sete serviços de Informação à Mulher, organizadas em suas respectivas comunidades sob a orientação da Themis. Na assistência jurídica às mulheres a Themis acompanhou mas de 200 processos sociais.
A seguir, passaremos trechos de vídeos sobre as ações da Drª. Zilda Arns e da entidade Themis, para que possamos visualizar os trabalhos que realizam.
Muito obrigada!